segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Pedaços de Escrita #43





Era uma noite tempestuosa, fria e escura. Chovia torrencialmente e caia granizo, a força do vento dava voz à borrasca. Felizmente não trovejava. Ellie enroscara-se no sofá com uma manta sobre as pernas, um livro e uma caneca de chocolate quente. Não pretendia dormir até Drew chegar a casa, porque se sentia mais segura à noite quando ele estava. Desde que se lembrava, tinha medo de dormir sozinha e quando ele não vinha, Ellie não dormia; ficava a ler ou a ver filmes. Nessa noite, pelo menos não estava rodeada pelo silêncio, algo que sempre detestara. 

Acabara de beber o último golo de chocolate quando começou a cabecear e ao fim de algum tempo fechou os olhos. Mas continuava a ouvir a chuva a tamborilar na vidraça e atenta a qualquer movimento. O cansaço acumulado ameaçava vencê-la, mas Ellie não se deixou vergar e continuou à espera. Embrulhou-se melhor na manta, inspirou fundo e concentrou-se na chuva.
Então ouviu o estalido metálico da porta e sentou-se devagar no sofá. Drew surgiu à porta da sala, esboçando um sorriso encorajador e Ellie levantou-se para o ir abraçar.
- Demoraste - murmurou ela.
- Desculpa, a chuva atrasou-me - respondeu ele sem deixar de sorrir.
Ficaram abraçados naquela calmaria apenas quebrada pela chuva por algum tempo. Drew beijou-a na testa e disse:
- É tarde, devíamos ir dormir.

Ellie não respondeu. Quando Drew olhou para ela, reparou que adormecera e carregou-a até ao quarto. Deitou-a sobre as cobertas macias, trocou de roupa e deitou-se ao lado dela, cobrindo ambos com uma manta. Abraçou-a e fechou os olhos. Na quietude do quarto o único som que continuava a fazer-se ouvir era o tamborilar constante da chuva na janela e o assobio do vento daquela noite tempestuosa, fria e escura.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

A Casa Redonda, Louise Erdrich





Quando um livro, além de best-seller, é também premiado deve ser mesmo bom. Não costumo ler livros premiados, nem os escolho por isso; escolho-os consoante aquilo que me chama à atenção na sinopse ou consoante o tema. Para além disso, e que me lembre, não há muitas obras que tenham por base um contexto de factos verídicos. Este livro retrata temas muito fortes de uma forma um tanto ou quanto simplista e incompleta, como é natural da perspectiva de um miúdo de treze anos que a autora nos apresenta. Por outro lado, o facto de evocar a complexidade as questões legais (e não só) em relação às reservas onde vivem os indíos norte-americanos, que ainda hoje provocam tensão nos EUA, chama à atenção para a necessidade de soluções para determinados problemas que não se resolverão se a comunidade continuar a fingir que está tudo bem; isto porque o racismo e a violência contra as mulheres continuam a ser problemas sociais presentes no mundo contemporâneo e estão longe de ter um fim à vista. Esta é uma obra que proporciona uma leitura reflexiva sobre a força de carácter e integridade necessárias a proceder correctamente, mas também sobre as consequências que advêm das atitudes mais inocentes.   

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

A Voz, Juliet Marillier





Um mês após a leitura de O Voo do Corvo, eis que me deparei com o momento da verdade sobre esta trilogia. Neste último volume, depois dos acontecimentos decisivos que lançaram Neryn, Flint, os Boa Gente e os Rebeldes numa corrida contra o tempo, Marillier apresenta-nos o lado vitorioso da perserverança e da coragem, mas também a mágoa da perda e o confronto cru com a própria consciência. A narrativa de Marillier é tão excelente que nos desperta uma miríade de emoções, como se vivêssemos a história ao lado dos protagonistas, algo que, na minha sincera opinião, não acontece com qualquer autor. Gostei muito das obras de Marillier que li anteriormente, desta gostei mais ainda que rapidamente se tornou uma grande favorita e acho que a autora dificilmente deixará de nos supreender.