sexta-feira, 5 de junho de 2015

Pedaços de Escrita #29






É o crepúsculo e o ar está calmo, anunciando uma noite morna de Verão, depois do ar abafado da tarde. De olhar fixo na linha, cada vez mais indefinida, do horizonte, perco-me numa gíria de palavras soltas que não significam nada, são completamente vazias de sentido. Então porque me prendem? Giram em torno dos meus pensamentos confusos, fazendo-me reviver memórias que preferia esquecer. Mas o esquecimento não chega e a intensidade das palavras é tal, que o meu controlo se desfaz e do âmago de mim irrompe um grito animalesco, de raiva e de dor, que se perde no negrume crescente da noite.

Com a incerteza desvanecem-se todas as esperanças e qualquer vestígio de compreensão. Vergada pela impotência, fito a noite estrelada sem ver a sua beleza, por me encontrar tão perdida nesta solidão. Onde estás? Todas as minhas preces caíram no vazio e o desespero quase me quebra. O céu passou lentamente de negro a cinzento e a aurora chegou, mas não sou capaz de sorrir perante a maravilha de um novo dia. Porque é mais um dia sem ele, sem saber se saberei o que aconteceu, se o verei novamente. A ignorância corrói-me os nervos, deixando-me incapaz de pensar em algo mais do que aquilo que não sei. Ergo o olhar para o sol nascente e a inconsciência apodera-se de mim. 

É novamente crepúsculo quando recupero a consciência. Alguém me trouxe para o meu quarto, pousando-me sobre a colcha fina da cama. Sentei-me abruptamente, quase sem conseguir respirar, e, à luz difusa do lusco-fusco, vi-o deitado ao meu lado. O meu amor estava ali, profundamente adormecido; finalmente regressara para junto de mim. Livre da angústia que me subjugara durante tanto tempo, voltei a sentir-me feliz e em paz, adormecendo aninhada junto dele com um sorriso nos lábios.

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